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5 de dezembro de 2007

 

Desafio dos blogueiros contistas






Finalmente terminei o desafio de Zarastrutas. Tinha que escrever um conto com garota de programa, lebre e Ernest Hemingway.




The cow went to the swamp
(autor: El hombre maíz)


Era o princípio da década de 50, quando conheci o escritor norte-americano Ernest Hemingway durante uma viagem a Havana. Estava no seu bar favorito, o do Hotel Ambos Mundos tomando um mojito e decidi puxar assunto. Falamos das agitações socialistas que tomavam o país e Hemingway recordava episódios do tempo que lutou na guerra civil espanhola.

Foi aí que ela entrou no salão, Lola. Uma mulata cubana que não fazia a mínima questão de esconder sua condição de garota de programa, ao contrário parecia desfrutar dela. Hipnotizara o salão com seu porte de modelo, alta, de postura erecta, com ombros largos e seu corpo atlético, talvez atlético demais, muito atlético mesmo. Chegava a lembrar um pouco o Dida, mas um pouco menos feminino.

Hemingway, um mulherengo incurável, ficou ali obcecado assistindo Lola se aproximar passo a passo do balcão onde nos sentáramos. Ofereceu um Martini à moça, mas ela preferiu whisky, dose dupla, sem gelo. Bebeu de golpe sem mirar os olhares pecaminosos do escritor. Logo, virou-se:

- Me llamo Lola. Pero hay quien me llame como o mar

O poeta ruborizou-se com as palavras da mulata. "Linda e poetiza", pensava. "Há quem me chame como o mar", suspirava. Não haveria mesmo comparação mais acertada. Lola era escura, profunda, misteriosa, imprevisível, assim como o mar. Eu também me surpreendi com as palavras da biscate, que compreendi apesar de, na época, ainda não dominar o idioma espanhol.

Virei-me para o lado e deixei os dois conversando sossegados, não queria intrometer. As palavras de Lola ainda saculejavam pela minha cabeça "Hay quien me llame como o mar". Refletia sobre a beleza da língua espanhola, sobre o como uma frase simples tomava outras proporções quando ditas em tal idioma, lembrava do encanto das minhas primeiras aulas de castelhano, quando me surgiu a duvida: O mar? O certo não seria El mar?

Aquilo era incompreensível, um brasileiro bilingue poderia confundir o artigo definido da língua portuguesa com o da língua espanhola, mas uma cubana que só fala seu idioma, jamais. Seria Lola uma brasileira? Jamais, com aquele sotaque! Foi então que compreendi o absurdo da situação! Então ela era..ela era ...

Queria dizer a Hemingway o que achava de Lola, mas ela estava ali ao lado, com seus ombros largos e seu porte atlético, atlético demais, muito atlético mesmo. Podia dizer em inglês, mas uma garota de programa cubana está acostumada a atender gringos, poderia ter noções do idioma dos vizinhos do norte. Foi então que pensei em maquiar a informação, codificá-la de uma maneira que apenas o escritor reconhecesse, apenas alguém culto acostumado com as figuras de linguagem e os ditos e expressões populares. "Está levando gato por lebre", pensei.

- You are taking a cat as a hare.

Disse convicto, sem pestanejar, para que me levasse a sério, mas o máximo que consegui foi um olhar de espanto dos dois. Lola virou a cara enfadada, Hemingway continou fitando-me os olhos. Repeti suplicante:

- You think it's a hare, but it's a cat. Believe-me

Lola parecia ter descoberto minhas desconfianças e levantou-se bruscamente, puxando Hemingway pelo braço. Pensei em contê-lo, puxá-lo pelo outro braço, mas o porte atlético, muito atlético mesmo de Lola me intimidou. Saíram os dois em busca de privacidade, eu pedi um dry martini pra afundar as mágoas que já sentia pela sorte do gringo. "Now, the cow went to the swamp", pensei.

Alguns podem achar que fui covarde em não ter ido mais longe na tentativa de salvar a dignidade do nobel de literatura, mas me sinto no direito de ter minhas limitações e meus medos, afinal, assim como Lola, sou apenas um homem. O fato é que no dia seguinte voltei ao bar do Hotel e encontrei Hemingway com uma expressão dúbia, sentado de ladinho, rabiscando num caderno. Preferi não tocar no assunto da noite anterior, mas ele começou.

- A cat? You call that a cat? So, what is a horse for you?

Fitava-me sem raiva, parecia ainda em dúvida sobre a experiência anterior. Envergonhado por não ter podido ajudá-lo melhor, decidi me retirar. Ao passar próximo ao caderno que ele rabiscava, vi que começava um novo texto. Não sabia na época se seria um romance ou um conto, mas o título estava lá: O velho e Omar.

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Comments:
Putz!
Como sempre, bão demais!
 
HEUAHEUAHEUHAUEHAUHE!!!!
PERFEITO, esse continho eu realmente gostei XDDDD

Ok, agora vou lá estudar.
 
"OMAR"!!!...HA!HA!HA!...Q OTIMA SACADA, KRA!
PQ NAUM PENSEI NISSO ANTES!
POW, SE EU TBM TIVESSE IDEIAS ORIGINAIS ASSIM COM CERTEZA TAVA RICO!!!
 
Perfeito, original, bão demais ... uai! Blogar massageia o ego, né!? Vocês são foda.
 
ducaraio.
 
hahaha. muito bom!
 
Huahahahaha! Mandou bem novamente!

"Chegava a lembrar o Dida... menos feminino". Hahaha!

Lagoa da Canoa, a cidade natal do Dida, que também é a do Hermeto Pascoal, fica aqui pertinho. vou mandar o texto prá uma amiga de lá. Acho que ela vai adorar!
 
Corn Face,

Missao cumprida. Voce e' o rei das associacoes metalinguisticas. E como voce falou, cada um teu seu estilo e tres palavras podem virar um bilhao de contos com perspectivas diferentes. Eu tentei levar o conto para a guerra civil espanhola (tentei facilitar para vc :) ), mas vc surpreendeu e levou para a Cuba de uma outra epoca. Antes que eu esqueca, o texto ficou muito bom.
 
Simplesmente perfeito! Quanto talento!
 
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